Roberto Luis Luchi Demo
Bacharel em Direito pela UFPR, Especialista em Processo Civil pelo IBEJ e Procurador Autárquico do INSS em Cascavel (PR)
1. Introdução
O mundo contemporâneo assiste a uma enorme concentração de riquezas. A maioria das pessoas podem ser consideradas pobres no Brasil. Partindo do suposto de que o conflito de interesses somente pode ser resolvido pelo Poder Judiciário [que cobra por seus serviços – art. 19, CPC], a disponibilidade financeira constitui relevantíssimo pressuposto da possibilidade de pôr em causa direitos ou de defendê-los em juízo.(1)
O acesso à justiça é exercício da cidadania. Um Estado que tem por fundamento a cidadania [art. 1o, II, CF/88], há de estabelecer mecanismos de isonomia material no processo aos despossuídos, cuja desproporção de poder econômico em relação à parte contrária há de ser equalizada [art. 5o, LXXIV, CF/88].
O processo civil analisado da perspectiva do consumidor [consumidor do serviço jurisdicional] é a tônica do acesso à justiça. É uma realidade a busca de proteção pelas pessoas. Daí a necessidade de ampliar a via de acesso à Justiça como meio de evitar a perpetuação de insatisfações reprimidas e a consumação de decepções que constituem fator de generalizada insatisfação social e instabilidade das instituições democráticas, e até como fator de legitimidade da jurisdição na sociedade brasileira contemporânea. (2)
O acesso à justiça ou à ordem jurídica justa, a que se refere prestigiosa doutrina nacional, foi abordado pela primeira onda processual renovatória(3), sob o credo do método instrumentalista do processo(4), e pode ser sintetizado na assistência jurídica gratuita e integral, cujas facetas ora passo em revista.
2. Assistência jurídica integral e gratuita
A assistência jurídica integral e gratuita veiculada no art. 5o, LXXIV, CF/88, norma de eficácia contida ou restringível(5), tem natureza de direito público subjetivo(6). Trata-se de gênero(7) que compreende a assistência jurídica gratuita stricto sensu, a assistência administrativa gratuita, a assistência judiciária gratuita e a gratuidade de justiça.
A assistência jurídica gratuita stricto sensu são atividades técnico-jurídicas voltadas à informação, consultoria, aconselhamento e orientação que, numa palavra, constitui uma atividade educativa a ser proporcionada pelo Estado fora do processo judicial ou administrativo (8)e(9).
A assistência administrativa gratuita e a assistência judiciária gratuita são a atividade técnica que o advogado desempenha dentro do processo [judicial, nesta e administrativo(10), naquela], às custas do Estado, buscando tornar efetivo o princípio da isonomia no processo. Certo, a igualdade processual é formal. Porém, visa a assegurar a igualdade substancial entre as partes, que somente será efetivada si et in quando as oportunidades de ambas puderem influenciar igualmente no processo(11).
São todos institutos de organização estatal ou paraestatal, pertencendo ao Direito Administrativo.
A gratuidade de justiça(12) [também nominada justiça gratuita] abrange a dispensa de antecipação e a isenção de despesas processuais próprias, bem assim a dispensa provisória de ressarcimento de despesas processuais e do pagamento de honorários de advogado da parte contrária, exercitável em relação processual. Trata-se de instituto de Direito Processual(13).
É dispensa de antecipação das custas de todos os atos processuais praticados pelo beneficiário, inclusive por intermédio dos oficiais de justiça e das publicações em jornal(14), consoante art. 3o, I, II e III, Lei 1.060/50. De isenção legal não se trata: a dispensa é de antecipação de despesas, e não da própria despesa, que o beneficiário de justiça gratuita ficará obrigado a ressarcir ao Cartório Judicial ou ao Estado mesmo [tratando-se de Cartório oficializado] em caso de mudança de fortuna no prazo de 5 anos [art. 12, Lei 1.060/50]. Isenção propriamente dita somente há em relação à indenização às testemunhas [inc. IV] e aos honorários de perito e de advogado do assistido [inc. V](15), esta última por ser inerente à assistência judiciária gratuita, aquelas por ausência de permissivo à cobrança [art. 12, Lei 1.060/50].
É dispensa provisória porque, em caso de sucumbência, o beneficiário será dispensado provisoriamente do ressarcimento à parte contrária das custas processuais e do pagamento dos honorários do seu advogado [art. 11, §2o, Lei 1.060/50].
Observa-se, portanto, que a justiça gratuita atua sempre na hipótese em que o beneficiário ficaria obrigado a fazer desembolso em virtude do processo, dispensando-o do ato naquele momento procedimental.
continua....
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